Centenárias, dez empresas Top of Mind discutem a evolução dos produtos e a relação com o cliente

No ano em que a Folha fez um século, publicação traz a história de marcas premiadas que têm mais de cem anos

São Paulo

Para companhias que atravessaram mais de um século de história, não é fácil a tarefa de manter suas marcas vibrantes nas mentes de seguidas gerações. No ano em que a Folha fez um século, o jornal desenvolveu iniciativas editoriais como o especial Empresas Centenárias e a série Histórias Centenárias. Com o lançamento da 31ª pesquisa Top of Mind, a revista traz a trajetória de marcas premiadas que pertencem a dez dessas organizações.

O segredo para ser bem-sucedido, segundo as próprias, está no consumidor: é entender a evolução de desejos e necessidades do público. "Não importa se tem um ano ou cem anos. Para se manter viva, é essencial que tenha vínculo com o cliente e que se renove constantemente", diz Marcelo Melchior, presidente da multinacional Nestlé no Brasil, que inaugurou sua primeira fábrica no país exatamente em 1921.

Do mercado cervejeiro aos combustíveis, passando pelos setores de alimentos e financeiro, o cliente agora tem muito mais poder de voz e mobilidade para trocar de fornecedor caso esteja insatisfeito. É o que Paula Sayão, diretora de marketing e comunicação do Banco do Brasil, chama de "empoderamento dos consumidores proporcionado pela tecnologia". "Ele hoje é antenado, compara, tem poder de fala, cultiva certa infidelidade em relação às marcas", diz a executiva do banco, fundado em 1808.

As redes sociais amplificaram a voz do público, e qualquer ação ou posicionamento de uma companhia pode gerar uma resposta coletiva instantânea, às vezes, sobre assuntos inusitados e imprevistos, acrescenta Glauco Paiva, gerente de relações corporativas da Shell Brasil, uma empresa que atua no país há 108 anos.

"O modelo de comunicação unilateral, em que uma organização emitia mensagens exclusivamente por meio de comunicados, press releases e fatos relevantes, não se aplica mais", compara.

Para Gustavo Castro, diretor de marketing da cervejaria Brahma, a pandemia antecipou no Brasil tendências que já vinham sendo gestadas, mas não concretizadas.

A chegada do coronavírus atingiu em cheio a maneira como os clientes se relacionam diretamente com a marca. O bar, que era o local de maior consumo da bebida antes da pandemia, foi substituído pela casa.

A despeito da recente retomada de restaurantes, shows e outros eventos presenciais, nem tudo deve voltar aos padrões antigos, opina o executivo. Castro projeta que o consumo seguirá misto.​ Essa é uma das mudanças do curto prazo. No longo, o mercado cervejeiro passou por um processo de amadurecimento revolucionário para os pensamentos do marketing.

As novas gerações não vão se lembrar das propagandas que exibiam mulheres em pouca roupa tentando passar alguma mensagem de sensualidade para vender cerveja. Há pouco menos de uma década, o debate sobre o padrão machista dessa indústria avançou, ajudando a reverter a representação da mulher para um personagem com autonomia, capaz de ocupar, ela própria, o papel de consumidora, não de objeto de consumo.

Neste ano, a Nestlé fez um tributo à mulher contemporânea na edição comemorativa de Leite Moça, para marcar seus cem anos de operações no Brasil. No lugar da icônica camponesa que ilustrava a embalagem, a empresa colocou imagens de empreendedoras brasileiras reais —negras, brancas, gordas, magras e mais velhas, todas com histórias de ligação com a companhia.

Segundo Marcelo Melchior, a ação refletiu a evolução da organização, da marca e da sociedade. E reforçou o posicionamento de sempre apoiar e dar visibilidade às mulheres.

Há cem anos, o Leite Moça representava uma inovação tecnológica para a época, outra característica necessária para manter a vitalidade ao longo do tempo. Assim foi também com o leite em pó, o café solúvel e o café em cápsula, anos depois.

Redes sociais hoje são exaltadas como uma potente ferramenta de relacionamento, mas no século passado a interação com consumidores já acontecia. Na década de 1950, a União descobriu que receitas funcionavam como um canal de comunicação e criou um concurso culinário.

"As melhores foram selecionadas e publicadas nas embalagens em 1956, o que levou à criação da Cozinha Experimental União, em 1957, para testar e avaliar todas as enviadas pelo público. Isso originou a primeira edição dos tradicionais livros de receitas União", lembra o gerente de marketing Raphael Fernandes.

Também no setor de alimentos, a Selmi, dona das marcas Galo e Renata, equilibrou tradição e tecnologia para elevar a capacidade produtiva. Até hoje, seu macarrão é produzido de acordo com a receita da massa italiana seguida há 134 anos pelo fundador Adolpho Selmi.

Inovação em diferentes categorias foi chave para a longevidade da Vigor, acredita Eduardo Jakus, diretor de marketing da empresa, que começou a operar em 1917.

Nas décadas seguintes, a marca abriria portas em categorias como margarina com manteiga e iogurte grego até chegar aos dias atuais, com o iogurte que aboliu o plástico —ele é entregue em casas e mercados numa embalagem de papel.

NESTLÉ

Ano de fundação: 1921
Cidade de fundação: Araras (SP)
Número de funcionários: mais de 30 mil


VIGOR

Ano de fundação: 1917
Cidade de fundação: São Paulo (unidade de embalagem de leite) e Itanhandu/MG (processadora de leite condensado)
Número de funcionários: 4.128


SHELL

Ano de fundação: 1913
Cidade de fundação: Rio de Janeiro
Número de funcionários: 800


BRAHMA

Ano de fundação: 1888
Cidade de fundação: Rio de Janeiro
Número de funcionários: a marca pertence à Ambev, que tem 30 mil


ANTARCTICA

Ano de fundação: 1885
Cidade de fundação: São Paulo
Número de funcionários: a marca pertence à Ambev, que tem 30 mil


UNIÃO

Ano de fundação: 1910
Cidade de fundação: São Paulo
Número de funcionários: a marca pertence à Camil Alimentos, que tem cerca de 5.500 colaboradores na América Latina, 3.800 deles no Brasil


TRAMONTINA

Ano de fundação: 1911
Cidade de fundação: Carlos Barbosa (RS)
Número de funcionários: mais de 10 mil


SELMI

Ano de fundação: 1887
Cidade de fundação: Campinas (SP)
Número de funcionários: 1.427


BANCO DO BRASIL

Ano de fundação: 1808
Cidade de fundação: Rio de Janeiro
Número de funcionários: 85.518


Caixa

Ano de fundação: 1861
Cidade de fundação: Rio de Janeiro
Número de funcionários: mais de 84.700

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.