Menções a marcas relacionadas à diversidade se pulverizam

Promissora, nova categoria Top Diversidade ainda não tem líder na pesquisa Datafolha

São Paulo

O tempo em que um ator, cantor e bailarino negro brilhava solitário nas peças publicitárias de uma grande varejista de moda parece cada vez mais distante. Se voltasse a estrelar a campanha de uma marca em 2021, Sebastian dividiria as telas com famílias negras que fazem coisas triviais como trocar presentes em datas especiais, mulheres que não só servem, mas bebem cerveja, e crianças que falam com naturalidade sobre o que é ter dois pais ou duas mães.

Se as imagens mostradas pela publicidade vêm encurtando a enorme distância que ainda separa o marketing da vida como ela é —ou de como gostaríamos que fosse o olhar sobre o que nos parece diferente—, o consumidor ainda não reconhece isso plenamente.

Perguntada pela primeira vez sobre qual marca lhe vem à cabeça quando se fala em diversidade, mais da metade dos brasileiros entrevistados pelo Datafolha respondeu com um surpreendente "não sei".

A estreia da categoria Diversidade no 31º aniversário da Folha Top of Mind se dá após uma longa luta de grupos sub-representados por visibilidade, coroada por debates quentes sobre o assunto nos anos mais recentes. Porém, se 56% dos brasileiros não souberam responder à pergunta, outros 44% apontaram uma marca —algo que, em um país com mais de 200 milhões de habitantes, mostra o quanto o tema é promissor.

Entre as marcas mais lembradas, os votos se pulverizaram e todas elas ficaram com percentuais pequenos e muito próximos, impedindo a definição de uma favorita.

"Não vejo isso como um problema, mas uma indicação de que está começando. A pauta está presente, mas o consumidor ainda não consegue identificá-la com a marca A, B ou C", diz Gisela Castro, professora de mestrado e doutorado em comunicação e consumo da ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing).

Para ela, sem um vencedor, a pesquisa indica que diversidade é uma categoria em construção. Mais forte em segmentos mais escolarizados, o tema tem fôlego para ser incorporado por outros grupos e reorganizar o ofício publicitário como um todo. "Não adianta dizer: ‘Sou uma marca amiga do diverso’. O consumidor precisa ter confiança que é mesmo", acrescenta.

Dilma Souza Campos, CEO da agência de ​marketing Outra Praia, conta que muito se falou de diversidade nos últimos anos, de programa de treinamento voltado para profissionais negros a campanhas retiradas do ar. "Mas quantos brasileiros sabem que chamamos isso de diversidade?"

Mesmo que algumas empresas sustentem metas de inclusão ambiciosas, Campos diz que a percepção de que ainda não se fez o bastante, somada à falta de diálogo de algumas marcas com o consumidor médio e à forma como a pergunta foi formulada na própria pesquisa, ajudam a explicar por que uma marca não conseguiu concentrar votos suficientes para ser a vencedora.

É preciso ser mais didático na hora de fazer a pergunta, ela observa. Da parte das marcas, também há espaço para melhorar a comunicação com a população brasileira como um todo.

Diretor de pesquisas do Datafolha, Alessandro Janoni explica que, da mesma forma que pode existir falta de didatismo na questão, ela reflete a ausência de didatismo nas campanhas publicitárias em abordar o tema de forma mais direta. "Não tem como comunicar da mesma maneira para todo o mundo com a mesma linguagem."

Eneus Trindade, professor em comunicação publicitária da USP, diz que a comunicação sobre diversidade precisa ser fortalecida. "Quando somos indagados sobre campanhas que pensam a diversidade, sobre o que estamos falando? Diversidade étnica, de gênero, classe social, ambiental, religiosa? Talvez a pergunta seja feita de um jeito que não é possível, dentro das referências do indivíduo, reconhecer os temas."

Luciano Machado Rodrigues, professor-adjunto do curso de comunicação social da Universidade Zumbi dos Palmares, vê avanços na publicidade, resultado da escolarização cada vez maior de grupos antes deixados de fora.

"Ainda assim, muitas marcas trabalham na chave do ‘um’: uma pessoa negra ou uma pessoa com deficiência, que funcionam como uma espécie de brinde para provar que valorizam a diversidade", afirma. "Queremos democratização de oportunidades."

Para Trindade, quando o assunto é diversidade, é importante que as marcas associem a busca por valor à perspectiva de avanço civilizatório. "Sabemos que consumir determinado produto não é a solução para a questão, mas ajuda a visibilidade, a aceitação e abre espaço para um outro olhar que permite a mudança."

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