O desafio de reduzir gases do efeito estufa na aviação

Eduardo Calderon, diretor do Centro de Controle Operacional e Engenharia da Gol, escreve sobre a descarbonização do setor

Eduardo Calderon
São Paulo

Entre todos os setores que se comprometeram a atingir a neutralidade de emissões de gases de efeito estufa até 2050, o de aviação é um nos quais esse processo é mais desafiador. Pelas suas características próprias, o chamamos de "hard to abate" —em tradução livre, difícil de diminuir.

Neste setor, não teremos as mesmas soluções que ajudarão no processo de descarbonização como no transporte rodoviário. O carro elétrico já é uma realidade, e caminhões movidos a eletricidade ou hidrogênio deverão chegar em pouquíssimo tempo. Soluções para aviões acima de cem passageiros, porém, não se mostram viáveis para os próximos 30 anos.

Eduardo Calderon, diretor do Centro de Controle Operacional (CCO) e Engenharia da GOL - Adriano Vizoni/Folhapress

Aeronaves da nova geração, desenvolvidas pela Boeing, Airbus e Embraer, oferecem redução de consumo de combustível — e, consequentemente, de gases do efeito estufa— em torno de 15% a 20%, mas estão longe de ser o suficiente para a descarbonização do setor.

A solução passa pela adoção de combustível renovável, o SAF, na sigla em inglês (Sustainable Aviation Fuel), que vem sendo adotado há mais de uma década, mas esbarra em um problema imenso: o custo. Hoje, o SAF custa de duas a quatro vezes mais que o querosene de aviação.

O impacto que a adoção dessa solução trará para uma indústria na qual o combustível já representa cerca de 40% dos custos é gigantesco. A expectativa é que essa diferença de preço caia ao longo dos anos, mas, até que se equiparem, teremos enormes desafios para fazer a transição energética de uma maneira que continuemos contando com preços competitivos das passagens aéreas.

Em todo o mundo, estima-se que serão necessários investimentos de bilhões de dólares para a construção de biorrefinarias, que irão suportar não só a substituição gradual do combustível fóssil por renovável como também o crescimento do setor de aviação.

Governos mundo afora têm feito esforços para viabilizar a transição energética. Na Europa, por exemplo, as companhias aéreas locais estão sendo obrigadas a aumentar gradualmente a mistura de SAF no combustível atual.

No Brasil, a Lei do Combustível do Futuro, sancionada em 8 de outubro, prevê reduções de emissões de gases de efeito estufa, em voos domésticos, a partir de 2027. Dada a sua tradição na fabricação de biocombustíveis, o país se coloca potencialmente como um dos maiores produtores de SAF e pode se tornar um "player" importante no processo de descarbonização do setor aéreo mundial.

É importante que o governo brasileiro continue com sua defesa firme das matérias-primas a serem utilizadas para a fabricação do SAF (etanol de primeira geração, óleo de macaúba, soja, entre outras), e que seja elaborada uma política pública estruturada, que permita o investimento interno e externo na construção da biorrefinarias essenciais para alavancar essa produção.

Não será uma caminhada fácil. Os custos para o desenvolvimento desse setor são astronômicos, e o impacto do eventual incremento de custo do SAF pode inviabilizar rotas, reduzir a demanda e trazer limitações para o setor aéreo.

*Eduardo Calderon é diretor do Centro de Controle Operacional (CCO) e Engenharia da GOL Linhas Aéreas.

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