Pandemia impacta o Top Destaques Regionais e cinco 'novatas' estreiam na ponta

Brilux, Maratá, Qboa, Santa Clara e União vencem categoria que revela as campeãs de cada região do país

Danae Stephan
São Paulo

As mudanças de comportamento do consumidor durante a pandemia causaram impacto expressivo no Top Destaques Regionais. Se nos anos anteriores dominavam margarinas, supermercados e redes varejistas, ganharam destaque agora água sanitária e itens básicos da mesa do brasileiro, como café e açúcar.

Todas as vencedoras do ano lideram a categoria pela primeira vez. Desde 2009, quando o Datafolha passou a fazer este levantamento, apenas uma marca de limpeza levou o prêmio (Ypê em 2015, no Centro-Oeste).

Para chegar aos campeões regionais, são consideradas todas as marcas citadas espontaneamente, e é calculada a diferença entre o percentual obtido em cada região e o seu total geral. Vencem aquelas que tiverem as maiores diferenças em relação ao total da amostra, considerando a margem de erro de dois pontos percentuais.

Nesta edição, a água sanitária Qboa saiu na frente em duas regiões, Sul e Centro-Oeste, e Brilux ganhou no Nordeste.

“Por mais tradicionais que sejam nessas regiões, não são itens de consumo relacionados a momentos de prazer. Isso é claramente um efeito da pandemia, resultado da preocupação com saúde e higiene”, diz Sandro Magaldi, especialista em gestão estratégica e vendas e autor do livro “Vendas 3.0” (ed. Campus).

Outra característica em comum é que são todas marcas nacionais, e parte delas compete com poderosas multinacionais. “A pesquisa mostra como o macroambiente influencia no consumo e muda as pautas do consumidor”, analisa Magaldi. “São marcas que têm uma sintonia forte com o público local.”

O aumento brusco da demanda por itens de limpeza também resultou em vantagem para empresas regionais.

“Em momentos de crise, sai na frente quem consegue tomar decisões estratégicas mais rapidamente, seja em relação a campanhas, seja sobre lançamentos de novos produtos ou distribuição”, observa Fernando Trevisan, diretor da Trevisan Escola de Negócios. “Grandes companhias tendem a ser mais engessadas e demoram mais para promover mudanças.”

A logística foi outro fator determinante para o reconhecimento das vencedoras. Por estarem mais próximas do seu público, conseguiram atender com agilidade as demandas locais, segundo Trevisan.

SUDESTE

É o caso da União, pioneira na produção de açúcar refinado desde sua fundação, há 110 anos, no bairro paulistano da Mooca. A marca foi a mais lembrada na categoria Açúcar, citada por 32% dos entrevistados pelo Datafolha. No Sudeste, esse índice sobe para 54%.

“A União tem em seu DNA a conexão com o público”, diz Christina Larroudé, diretora de marketing. Já na década de 1950, a marca dava voz ao público, com testes de suas receitas que iam parar nas embalagens dos produtos.

Também foi a primeira a criar uma cozinha experimental que oferecia cursos presenciais e de formação. “É natural que nosso consumidor, especialmente o de São Paulo, tenha uma memória afetiva da marca”, diz a executiva.

Com o isolamento, as pessoas passaram a cozinhar mais em casa, gerando um aumento da demanda. A União responde por 30% do faturamento do grupo Camil Alimentos, que teve receita líquida de R$ 1,7 bilhão de março a maio deste ano, um crescimento de 39,8% em relação ao mesmo período de 2019.

“Nossa estratégia a longo prazo não mudou, mas tivemos que fazer alguns ajustes em meio a este cenário desafiador, com uma reorganização do plano de mídia do ano”, conta Christina.

“Adaptamos as mensagens dos sachês de açúcar, incentivando as pessoas a ficarem em casa, e criamos uma campanha de ajuda às doceiras, parte importante do nosso público, que foram prejudicadas pelo cancelamento de festas e eventos.”

A ação convidava os brasileiros a indicar suas doceiras favoritas, que eram então divulgadas nas redes sociais da empresa, para que conseguissem mais encomendas.

Houve ainda doações maciças de alimentos, incluindo produtos de outras marcas, como arroz e feijão Camil. Mais de 200 toneladas de itens foram doados por meio de lives de artistas, entre eles Luan Santana e Anitta.

“Ficamos muito felizes com esse reconhecimento dos nossos consumidores, mas não pretendemos nos acomodar nunca”, diz a diretora de marketing. “Quem tem uma marca dessas nas mãos tem uma sorte e uma responsabilidade enormes.”

SUL E CENTRO-OESTE

Com 73 anos de mercado, a marca Qboa, do grupo Anhembi, é tão presente nos lares brasileiros que virou sinônimo de água sanitária —com exceção de São Paulo, onde o alvejante é mais conhecido como “candida”, nome de outro produto do mesmo conglomerado.

Qboa venceu nas regiões Sul e Centro-Oeste, onde alcançou 68% e 76% das citações espontâneas, respectivamente. No país todo, teve 30% de lembrança entre os entrevistados, o que lhe rendeu também o prêmio na categoria Água Sanitária.

Os números são reflexo de sua participação de mercado: 20% no território nacional, 50% no Sul e 49% no Centro-Oeste. Durante a pandemia, apresentou crescimento de 25% em relação ao mesmo período do ano passado.

“É um produto essencial, com alto índice de penetração nos lares brasileiros e de baixo custo. E que foi extremamente divulgado por órgãos públicos”, diz Renato Borducchi, diretor de operações do grupo, que nasceu em São Caetano do Sul (SP).

“Quando ouvimos falar do vírus pela primeira vez, estávamos em uma convenção de vendas da empresa. A partir dali, todos os nossos esforços se voltaram para a segurança dos colaboradores e o aumento do volume de produção”, recorda.

A Anhembi adaptou rapidamente toda a comunicação em rádio, redes sociais e pontos de venda, destacando a diluição correta da água sanitária para combater o novo coronavírus.

“Conscientes da relevância da nossa indústria no cenário de pandemia, doamos mais de 750 mil litros de solução clorada para diversas prefeituras, para desinfecção de hospitais, ruas e repartições públicas”, conta Borducchi. Em uma parceria com o governo de São Paulo, a companhia atendeu ainda cerca de 1 milhão de pessoas em situação de risco, com doação de cestas de higiene e limpeza.

Sua malha de distribuição permite chegar de Roraima ao Rio Grande do Sul, atingindo 150 mil pontos de venda. “Não à toa, é a quarta marca de água sanitária mais vendida no mundo. As três empresas que estão à nossa frente são multinacionais, o que dá uma ideia da força da nossa marca”, diz o executivo.

NORDESTE

Uma campanha maciça em TV, rádio e meios digitais ajudou a marca de produtos de limpeza Brilux a conseguir seu lugar na memória dos moradores do Nordeste.

“Temos presença muito forte na região e relação estreita com as principais festas tradicionais”, diz Renata Carvalho, gerente de marketing do grupo Raymundo da Fonte, detentor da Brilux.

No período das Festas Juninas, a campeã lançou a campanha “O Maior São João do Mundo em Casa”, patrocinando lives e conscientizando o público sobre a importância do isolamento social.

“Fizemos um replanejamento de toda a comunicação, com conteúdos voltados à higienização do lar, dicas para entreter os filhos durante a quarentena e como montar um home office eficiente. Também abordamos os cuidados com a saúde mental e financeira”, conta Carvalho.

Fundada em 1946, em Paulista (PE), a empresa doou cerca de 400 mil litros de água sanitária a unidades de saúde e hospitais públicos dos estados em que atua: Pará, Amazonas e Rio de Janeiro, além de toda a região Nordeste.

Segundo a Kantar, a linha Brilux, que reúne cerca de cem itens dos 350 produzidos pelo grupo, atinge 19% da população brasileira. No Norte e no Nordeste, está presente em 60% das casas.

NORTE

Nem açaí nem mandioca: o produto que habita a cabeça do consumidor nortista na pandemia é o café. Nesta edição do Top of Mind, Maratá e Santa Clara empataram como destaques da região.

São marcas muito fortes nessa parte do país. A Santa Clara, braço local do Grupo 3corações, nascido em Eusébio (CE), tem uma participação de mercado de 36% no varejo do Norte, de acordo com a Nielsen.

“Ela representa muito mais do que uma marca de café para a companhia”, diz Roberta Prado, diretora de marketing. “Criada em 1959 pelo nosso fundador, João Alves de Lima, está na nossa origem.”

Já o grupo Maratá, fundado pelo sergipano José Augusto Vieira há 50 anos, em Lagarto (SE), atua em vários setores, do agronegócio à construção civil. Seu café se mantém há mais de 20 anos entre os cinco melhores do ranking nacional da Abic (Associação Brasileira da Indústria de Café).

Colaboram para o reconhecimento dessas marcas as ações sociais desenvolvidas em parceria com instituições. A Santa Clara tem projetos com o Gacc (Grupo de Apoio à Criança com Câncer) do Amazonas, o Sesc/PA e a Fundação Social Raimundo Fagner, que ensina música a jovens do Ceará.

O Projeto Tribos é uma iniciativa própria que visa a valorização do trabalho de indígenas que produzem café no coração da floresta amazônica.

A Maratá criou uma fundação própria de amparo a crianças e adolescentes, que oferece educação infantil e fundamental gratuita à população. Também toca programas de apoio à geração de empregos e renda em parceria com Senac e Senai.

Ambas ampliaram suas ações durante a crise sanitária, doando alimentos a ONGs e adaptando as linhas de produção para fornecer itens essenciais à prevenção da Covid-19.

“É essa sinergia com a população local que possibilita a criação de laços legítimos e duradouros”, resume Roberta Prado, da 3corações.

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