Descrição de chapéu Opinião

Marcas memoráveis, como as que figuram na Folha Top of Mind, aproximam-se do espírito do tempo

Para sociólogo da ESPM, companhias, que vencem o teste do tempo, têm a sensibilidade de entender e se adaptar às linguagens e aos comportamentos dos consumidores

Gabriel Rossi
São Paulo

Até os anos de 1990, a televisão era protagonista na fábrica do nosso cotidiano, tendo participação central na vida doméstica e social do país. Nós, consumidores, interpretávamos e significávamos o mundo por meio do que assistíamos sentados no sofá. Era um ritual familiar quase religioso. As imagens em movimento se tornaram instrumentos de pertencimento e facilitaram uma relação afetiva, íntima, perdurável com muitas marcas.

Brastemp, Sadia, C&A e Bombril, por exemplo, estão em nossa memória afetiva e são lembradas até hoje. Entravam em nossas casas repetidamente, vendiam seus produtos e contavam histórias que ecoavam o universo simbólico dos seus consumidores. A TV, de fato, fez com que essas marcas ficassem cravadas no imaginário social.

Gabriel é um homem branco de cabelos pretos. Na imagem, ele veste terno com camisa branca por baixo e cruza os braços.
Gabriel Rossi é sociólogo, pesquisador e professor de comunicação e consumo da ESPM - Reprodução

O mundo mudou. Muitas transformações, principalmente comunicacionais, ocorreram nas últimas décadas. Sem o protagonismo da televisão, embora ainda importante, e da mídia de massa, inúmeros dispositivos, novas ambiências midiáticas e plataformas digitais das mais variadas tornam a conversa com o consumidor multifacetada, fragmentada e efêmera.

Tornar produtos e empresas lembrados e relevantes já não é tarefa das mais fáceis. Há inúmeras narrativas, discursos e interesses dos mais diversos brigando por atenção nas redes sociais.

Independentemente do cenário midiático e das significativas mudanças no comportamento do consumidor, algumas marcas parecem vencer o teste do tempo e se perpetuar na memória dos seus públicos.

Elas têm algo a mais. O fator lembrança, tão importante para o sucesso de qualquer iniciativa mercadológica, parece não ser problema para esses gestores. Melhor impossível: marcas que são lembradas funcionam como atalhos na psique de quem compra, elas não apenas facilitam escolhas, mas, muitas vezes, ganham um lugar especial nas histórias de vida das pessoas. Mas qual é o grande segredo por trás disso?

Essas marcas entendem que precisam dialogar com o espírito do tempo, com as linguagens e simbologias da sua época, com os temas e demandas presentes naquilo que os alemães chamam de "zeitgeist".

Dessa forma, atualizam seus valores simbólicos e continuam presentes na vida e no cotidiano dos seus públicos. Salta aos olhos o exemplo da Lacoste que, em um primeiro momento, tentou ignorar o público funkeiro da periferia, mas se viu obrigada a abandonar sua estratégia inicial e seguir com um público que, até então, se via excluído das ações proativas da empresa francesa fundada em 1933. Já não tinha mais escolha de se dissociar da periferia.

Por causa da pressão social e temendo um forte revés mercadológico, em uma clara sinalização de boas-vindas, a Lacoste lançou uma coleção e se reposicionou, injetando atualidade e dinamismo em sua presença social e mercadológica. Sendo agora parte da história que esses consumidores contam para eles mesmos sobre eles mesmos, a marca será lembrada por muitos anos.

Marcas memoráveis, aquelas que vencem o teste do tempo, têm a sensibilidade de entender e se adaptar às linguagens e aos comportamentos da época vigente.

Gabriel Rossi é sociólogo, pesquisador e professor de comunicação e consumo da ESPM

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